Ali na região da Champs-Élysées, tanto o Grand Palais quanto o Petit chamam atenção. Ao menos para mim, que sou apaixonada por arte e arquitetura. A maioria das pessoas e até das publicações celebra o Grand Palais e suas exposições-vedetes. Mas o Petit é um tesouro que merece ser mais bem explorado. Veja por quê.
Um Palais dedicado à diversidade artística da época
Assim como o Grand Palais, o Petit Palais foi construído para a Exposição Universal de 1900. O arquiteto dos dois palácios é o mesmo: Charles Girault, famoso e já reconhecido na época. Para o “pequeno”, ele quis fazer uma celebração à diversidade artística do período: a concepção da construção é a partir da pedra, que é esculpida e dá origem a decorações de tirar o fôlego. Mas a realização é marcada pelo modernismo, como para marcar a virada do século, que seria o início de uma nova era.
Ali era o local do Palais de l’Industrie, demolido em 1899 para dar lugar ao Petit e ao Grand Palais. Por isso, a construção do “pequeno” (em comparação com o Grand Palais) em forma de trapézio, com quatro corpos de construção em torno de um jardim semicircular, meio que teve que obedecer às disposições da antiga construção e do terreno.
O Petit Palais foi concebido para abrigar uma grande retrospectiva de arte francesa durante a Exposição Universal de 1900. Mas, ao final do evento ele não desapareceu. Ao contrário, desde 1902 é o museu de Belas-Artes da Cidade de Paris.
Desde então, suas coleções, que vão desde a Antiguidade Greco-Romana até o começo do século XX, não deixaram de ser enriquecidas principalmente através de diversas doações. Dentre os doadores, alguns personagens importantes no cenário artístico da época, como o famoso negociante de quadros impressionistas, Ambroise Vollard, e Juliette Courbet, irmã de Gustave Courbet.
Hoje, o Petit Palais abriga também exposições temporárias. Na verdade, essa tradição começou na origem do palácio mesmo, como parte da Exposição Universal. Uma das exposições marcantes foi a do Tesouro do Faraó Tutancâmon, que ocorreu em 1967 e atraiu mais de um milhão de visitantes.
As exposições temporárias são pagas, mas todo o acervo permanente do Petit Palais é gratuito, e muita gente não sabe disso.
A arte começa na própria construção
A decoração do Petit Palais, depois que ele virou museu, durou de 1903 a 1925. Girault queria dar ao edifício toda a pompa de um palácio oficial e que celebrasse toda a glória das artes. Por isso, ele mesmo escolhia os lugares onde queria a decoração. E a fachada, na Avenida Winston Churchill, já mostra toda essa filosofia de grandiosidade, de otimismo da Belle Époque. Ela é linda, suntuosa e tem 150 metros de comprimento.
Há um alinhamento imponente de colunas, interrompido pela grande porta de entrada. Só as grades ao lado da porta já merecem uma observação mais atenta: são em Art Nouveau e foram consideradas obras-primas já na época da construção do palais. O domo nos lembra o dos Inválidos (Invalides) e os detalhes esculpidos, o Louvre.
Aliás, para fazer esses relevos da fachada, foram contratados treze escultores, a maioria vinda da escola de Belas-Artes de Paris.
Uma obra interessante da fachada, logo acima da entrada, é La Ville de Paris protégeant les arts (A cidade de Paris protegendo as artes), de Jean-Antoine Injalbert: uma mulher sentada tem em uma das mãos o barco que simboliza Paris e é cercada por figuras mitológicas.
Ao entrar no palácio, a beleza dos vestíbulos e das galerias não deixa de chamar atenção. As pinturas do teto são lindas, realizadas por artistas como, por exemplo, Albert Besnard, Fernand Cormon e Alfred-Philippe Roll. Dentre elas, a que me chamou atenção foi o Le Triomphe Intellectuelle de Paris (Triunfo Intelectual de Paris), onde Ferdinand Humbert introduz na pintura um personagem então moderno: um passante comum, de chapéu e sobretudo. Fica ao final da galeria à esquerda, na livraria.
O Jardim
É semicircular e rodeado por um peristilo (galeria de colunas que rodeia um edifício). Nas abóbodas, Paul Baudoüin realiza afrescos como na época do Renascimento. Durante a primavera até o outono, mesas do café do museu ficam ali no jardim e parar ali no meio da visita é uma boa pedida para descansar um pouco, pois o museu é grande.
As coleções
O acervo do Petit Palais é enorme e bem importante. Uma parte dele é composta por obras que haviam sido compradas pela cidade de Paris, como, por exemplo, vários quadros que participaram dos salões de Belas Artes realizados no século XIX. A outra parte vem de doações. As principais foram dos irmãos Eugène e Auguste Dutuit (colecionadores de arte), em 1902; de Edward Tuck (empresário e mecenas americano) e sua esposa em 1930; Maurice Girardi (então colecionador de arte contemporânea) em 1952, entre outros.
Muitos mestres da arte podem ser encontrados no museu: Delacroix, Rembrandt, Monet, Sisley, Gustave Courbet, Gustave Moreau, Rodin, só para citar alguns. A ordem das salas não é bem cronológica, mas é mais ou menos assim:
Paris 1900 – Artes Decorativas
Logo que a gente chega, à direita da entrada fica a área que dá acesso às exposições temporárias. E à esquerda já vemos vários vasos, esculturas e quadros expostos.
São obras do final do século XIX e começo do XX. Há vasos de Émille Gallet, dos cristais Baccarat, escultura de Camille Alaphilippe, entre outros.
Arte do século XIX
Entrando à direita, vemos uma grande galeria com quadros e esculturas do século XIX. Nessa parte, destaque para vários quadros de Gustave Courbet, como Pierre-Joseph Proudhon et ses enfants en 1853 (1865), e esculturas de Aimé-Jules Dalou, como Le Triomphe de la République (o Triunfo da República, um modelo para a estátua que está na Place de la Nation).
Quase no final da galeria, à esquerda, uma pequena porta nos leva para sala dos pintores ao ar livre, que tem obras da escola de Barbizon ou influenciados por ela, como Johan Barthold Jongkind, e dos Impressionistas, como Camille Pissarro e até Monet.
Ao fundo, é a sala dedicada a Cézanne e a Modernidade. Além de quadros dele, há obras de Renoir, Pierre Bonnard e Mary Cassatt, esculturas de Aristide Maillol, entre outros.
Arte do Século XVIII
Paralela a essa galeria do século XIX, há três galerias dedicadas ao século XVIII. Aí nessa parte, estão móveis, quadros, como os da David e Fragonard, e cerâmicas, que mostram a evolução da arte desde o reinado de Louis XIV até o de Louis XVI. Nessa parte, adoro as porcelanas, principalmente a de Sèvres.
Ao final dessa galeria, estão as escadarias para o nível 0.
Nível 0 – Vou descrever como é o percurso que sempre faço, mas se quiser mudar um pouco não tem problema.
Sala dos Retratos realistas
Fica logo à esquerda da escadaria. Nessa sala estão os retratos pintados durante o século XIX, época do Realismo. Há obras de Jean-Baptiste Carpeaux, um busto de Victor Hugo feito por Rodin, obras de Daumier, Manet, entre outros.
Sala de Gustave Moreau e o Simbolismo
È sala do centro. Nela há obras Simbolistas, como o de Gustave Moreau. Outra coisa interessante é um estudo de Albert Besnard para uma das pinturas do teto da galeria de entrada do Petit Palais. Também gostei dos quadros de Félix Ziem.
Sala Paris 1900 – Carriès Escultor
Esta sala é dedicada ao escultor Jean Carriès. Há diversas obras dele e uma mesa interativa: várias máscaras do mesmo modelo, cada uma delas feita com um material diferente, podem ser tocadas. O objetivo é mostrar os diferentes materiais que podem ser usados em escultura.
A Galeria corredor do nível 0
Ao final dessa sala, entrei em uma galeria que interliga várias salas. Logo no começo, a sala de jantar da casa do arquiteto Hector Guimard, concebida por ele mesmo em 1909 e doada pela esposa em 1948.
Nas salas seguintes, várias tendências do século XIX, entre elas, há a sala dedicada ao Romantismo, com a obra Combat du glaour et du pacha (1835), de Delacroix – e a sala dedicada à pintura de História (um tipo de obra que valoriza acontecimentos históricos e mitologia, e que era considerado o gênero de pintura mais importante na primeira metade do século XIX).
Uma coisa que achei interessante – e vai do meu gosto pessoal – são as salas dedicadas à redescoberta da Idade Média. Não se trata aqui de obras feitas na época medieval e sim obras de artistas do século XIX que retratavam a Idade Média. Olha que interessante o quadro de Jan Van Beers, Funérailles de Charles le Bon (Funeral de Charles le Bon (1876), que está abaixo.
A arte do século XVII
Da metade ao final da Galeria é parte dedicada ao século XVII. Há relógios, objetos de arte, pinturas, estampas e gravuras. O destaque aqui é a grande coleção do museu em Arte Flamenga, com quadros de vários artistas da região dos Países Baixos e muitas gravuras e estampas de mestres como Antoon Van Dyck, Rubens, entre outros. O Petit Palais é conhecido por ter o maior acervo da França em arte da Holanda e Bélgica.
Renascimento
Ao final dessa galeria, está a coleção de arte Greco-Romana. Mas antes de visitá-la, vamos um pouco mais à direita para entrar na parte dedicada ao Renascimento.
Nessa grande sala, o destaque vai para os cristais de Veneza, os baús de casamento, as esculturas, livros e retábulos. Há uma obra saída do atelier de Boticelli: uma cópia de Vierge à l’Enfant avec Saint Jean-Baptiste (Virgem com o Menino e São João Batista), o original está exposto em Londres (é que ao realizar as encomendas, muitas vezes os artistas faziam cópias da própria obra encomendada). Há também uma pintura de Hans Cranach, irmão do famoso Lucas Cranach, o jovem.
A Coleção de Arte Greco-Romana
Voltando para a sala das Antiguidades, nos surpreendemos com a conservação das obras. A maioria delas foi doada logo em 1903 pelos irmãos. Há bustos da época do Império Romano, decoração de tumbas, vasos gregos até mesmo do século V a.C.
Nessa parte, achei interessante as esculturas de Isis, realizadas na época romana, mas na região do Egito. Elas mostram bem como foi a mistura artística, religiosa e cultural nesse lugar.
Obras da Mundo Cristão (Idade Média) Ocidental
À esquerda, está uma galeria dedicada à Idade Média no Ocidente. São esculturas, marfins, retábulos, praticamente todos com motivos religiosos e realizados em madeira. Há também uma parte interessante de iluminuras (livros escritos e pintados à mão, pra simplificar).
Mundo Cristão (Idade Média) Oriental
A Galeria continua, mas passa a abrigar os ícones da Idade Média no Oriente. Há obras realizadas depois da queda do Império Bizantino, mas em todas elas vemos a influência da arte bizantina. As cores são lindas. Há muitos São Jorge, santo popular na região.
Bom, esse foi o percurso que fiz na maioria das vezes em que fui ao museu. Mas a ordem das salas pode ser mudada, já que várias delas são interligadas. Quem tiver tempo, pode dividir a visita em mais dias, já que a entrada é gratuita para o acervo permanente. Com certeza, visitar o Petit Palais é o jeito mais barato de ver obras-primas de grandes mestres, além de poder admirar um palácio que é um sonho.
Petit Palais
Musée des Beaux-Arts de la Ville de Paris
Avenue Winston Churchill
75008 Paris
Metrô: Champs-Elysées Clémenceau, linhas 1 e 13
Horários: de terça a domingo, das 10h às 18h.
Quintas-feiras – exposições temporárias até às 20h
Gratuito para o acervo permanente
As exposições temporárias são pagas
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